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quinta-feira, abril 06, 2006

Das minhas mais ridículas infantilidades

Eu atraio, não é possível.
É um imã mesmo, cousa de outro mundo. Se fosse dado a crendices e não tão cético como sou, diria que tenho um Erê bonachão como encosto.
E estou com muita vergonha de escrever sobre esse fato. Sei porém, que uma vez escrito, ele estará exorcizado.
Sim, o texto é grande.
Não, não tenho uma versão menor...se quiser não leia, porra!
...

Esses dias, la pela hora do almoço, estava eu voltando para casa em um coletivo lotado. Vocês, meus três corajosos leitores, devem estar se perguntando por que minhas histórias sempre são ambientadas em ônibus. Seria uma espécie de obsessão?

Me faltam reais para fazer análise e não vou poder responder a esta indagação com exatidão. O fato é que se trata um local que obriga um contato social efetivo com o desconhecido, prática da qual não sou lá muito adepto.

E lá está você, sentado ao lado de alguém que não conhece; que pode estar usando leite de rosas como desodorante; ser um psicopata; estar devendo o SPC/Serasa; ser presidente do fã clube da Perla ou sei lá, qualquer coisa louca nesse mundo de loucos.

Não obstante já estar lotada, a carroça parou em frente a uma escola estadual e, de sopetão, entraram umas 500 crianças barulhentas e emelecadas. (Eu mereço!) Como não havia lugares para que todas se sentassem, duas menininhas foram ficar de pé perto de mim. Logo na parada seguinte, a senhora avantajada que ocupava 90% do banco onde eu estava semi-sentado, desceu.

(_Vai com Jeová, bola de carne! Vai que não to bom hoje não...)

O acento nem mesmo chegou a esfriar e as duas fofinhas sentaram-se juntas no banco, onde já havia minha pessoa avolumada. Ajeita aqui, acerta de lá e seguimos rumo como uma apertada família feliz.

Começaram de ti-ti-ti a contar causos daquele jeitinho que só os pequeninos têm! Mesmo não sendo muito fã de crianças, comecei a prestar a tenção em sua forma meiga e engraçada de se colocar diante do mundo.

E falavam sobre a escola, as tias, os colegas e os deveres de casa...Foi quando uma delas olhou para mim com toda a simplicidade e ingenuidade do planeta e perguntou: _você está em que série tio?

Meu coração sorriu emocionado...Que gracinha! Acho que vou mudar de opinião sobre crianças. Vejo agora que elas não são apenas pequenos problemas ambulantes sem escrúpulo social algum, mas são também graciosas e cheias de espontaneidade.

_Tio já acabou a escola, fez faculdade. – respondi solícito, com certa doçura até, o máximo que minha personalidade permite.

_Então você é grande? – perguntou a outrazinha, toda surpresa.

(Que crianças cativantes! Todos do ônibus, a esta altura, estavam rindo com sua desenvoltura)

_Sou ...sou grande! – entrei no clima e neste ponto já estava trocando olhares cúmplices com outros passageiros que se divertiam com minha recém estabelecida intimidade com aquelas anjinhas.

_Você trabalha? - indagou a mini-mocréia em tom seco, como quem dá uma facada sem sentir nenhum remorso por isso.

O meu queixo caiu. Pode notar que estou com uma tala no queixo até hoje! Que maldita gente...Tinha que estragar tudo, a pestinha. Era possível ver a maldade nascendo em seus olhos miúdos. Juro que vi brotar até chifrinhos em sua carinha angelical.

Agora me diz se ela tinha que tocar nesse assunto? Já estava me esquecendo que crianças são assim, cutucam profundo na ferida, sem nenhum dó, nem piedade. E ainda com todo mundo olhando...

_Não...é...mais ou menos – baixei o tom e respondi todo em constrangimento.

Os olhares das pessoas continuavam voltados para nós e eu tentava desesperadamente achar um jeito de me afundar no banco.

_Trabalha ou não trabalha tio?!
– a pestinha reivindicava explicações. Pensei em ignorá-la, mas os outros passageiros, que não têm nada o que fazer de suas vidas vazias, já participavam intensamente e repousavam olhares de cobrança sobre mim.

_Tio faz freela! – a voz saiu mais alto do que eu esperava, mais do que eu pudesse controlar. O trocador me olhou de relance enquanto contava as moedas de R$ 0,10. Ela, minha voz, por conta própria resolveu dar explicações aos outros ouvintes, ignorando a cara de curiosidade das monstrinhas que não faziam idéia do que viria a ser isso.

Dei uma risadinha tênue para não parecer muito incomodado com o rumo que a prosa havia tomado. E dono de toda a falsidade do universo, passei a mão na cabeça de uma delas, controlando-me para não afundar-lhe o crânio.

_A Minha mãe trabalha, sabia?! – a fulaninha malévola comentou toda contente, como se eu quisesse lá saber se ela tem mãe, ou ainda se trabalha. A outra chegou a comentar de um tal de Wesley que trabalhava também. Caguei baldes pra Wesley...caguei e andei...caguei, andei mais um pouco e fiz montinho pra Wesley!

Com medo do linchamento que se seguiria se eu perguntasse com o desdém pretendido se a mãe dela era doméstica, tentei por outro caminho mais diplomático.

_Tio é autônomo...trabalha quando quer, acorda a hora que quiser...essa vida tem um monte de vantagens. – uma outra patética tentativa de me explicar para elas e para os outros enxeridos.

_Ihhhhh Mamãe trabalha todo dia! – contra-argumentou a fofíssima e as risadas tomaram conta dos bancos ao redor.

(Tem gente que não se percebe!)

_E eu faço pós-graduação (aquele sem argumentos que resolve apelar)! Sua mãe faz pós-graduação?! – perguntei em um tom ridículamente provocativo, de criança quando quer superar a outra e comecei a sentir muita vergonha de mim nesse momento!

_Eu não sei o que isso – me olhou com petulância - mas minha mãe trabalha e você não! – não satisfeita em me arrasar, a peste ainda finalizou a frase com uma careta que com que todos voltassem a gargalhar.

Minha integridade não me permitia prosseguir ali. Para o bem de minha já pouca auto-estima, encerei o bate-boca e saltei bufando dois pontos antes. Ao sair, ainda ouvi uma velha desocupada murmurar algo como: “não sabe brincar não é garoto?!”

Pensei em fazer um sinal feio com o dedo e descer correndo, mas talvez pudesse vir a me odiar profundamente se o fizesse. Já estava me odiando aliás...

Fui andando para casa com uma certeza, a de que nunca mais olho para uma criança. Pode ser a mais fofa que eu não estou nem ai. Se me convidarem para ser padrinho de alguma, eu não olho para ela. Jogo a água na cabeça e tal, mas não olho.

O mundo definitivamente não é seguro perto delas!
:o)

10 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Vc e os ônibus... vc PRECISA continuar andando de ônibus pra nos proporcionar essas histórias fantásticas!!!

11:42 AM  
Anonymous Anônimo said...

Noite de segunda-feira, meu pai deixa minha irmã pequena lá em casa pra eu tomar conta.
Vou pôr uma pizza no forno pra ela comer, toda cheia de amor com a criança. Quando eu me abaixo, ela diz:

- Cecília, sabe de uma coisa?
- Quê?
- Tu tem o bumbum tão grande!

Cretina.

12:07 PM  
Anonymous Anônimo said...

Eu até já tive jeito com crianças, mas isso ficou num passado distante....rs - Beijos!

10:49 AM  
Anonymous Anônimo said...

Outro dia me peguei ouvindo duas pessoas conversando um assunto sem noção no ônibus. A primeira coisa que pensei foi: "isso daria um ótimo texto pro blogsburger". hehehehehehehe. Conversa sem noção em ônibus tem a sua cara.

3:31 PM  
Blogger Stupid Guy said...

AHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH só vc mesmo pra contar as histórias dessa forma. Adoro passar aqui! Bjo!

5:03 PM  
Anonymous Anônimo said...

é por isso que eu só ando de táxi!
u-hu!

beijo

5:29 PM  
Anonymous Anônimo said...

Nego, aprendi uma coisa nessa vida: crianças são diabretes. Qto mais corda vc der, mais fácil elas enforcam vc. O negócio é sair de fininho e não dar atenção... ou então dar um pisão no pé do capetinha e sair correndo pra não ser linchado.

Bjos,

Brunin.
http://ubbibr.fotolog.com/nobru1401/

12:42 AM  
Anonymous Anônimo said...

heheheheh :-D ...só você mesmo pra me fazer rir hoje!

Abraço!

8:39 PM  
Anonymous Anônimo said...

hauhauahauaahuah
Que saudade que eu estava do seu blog!!!!
Adooooooooooooooooro
Bju

5:39 PM  
Blogger Luciana Xavier said...

Amei, amei, amei. Gritei aqui de tanto rir.
Agora, duas lições pra vc. Primeira: não tenha medo de mentir. Nunca. Minta, minta sempre, aumente. Ainda mais se for pra criança. Elas acreditam tanto em mentiras quanto mulheres carentes.
Segundo: essas coisas só acontecem com você em ônibus porque vc é pobre. Se fosse rico, não aconteceriam, pq vc teria um Citroen Xsara.

12:58 AM  

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